Coluna de Marcelo Sant`Ana, para o Correio*:
"É bom ser o filho favorito
Todo filho compara a atenção que recebe dos pais com a que é dada aos irmãos, sobrinhos, netos... Os pais são nosso primeiro amor. O Dia das Crianças é a hora dos ciúmes: o tira-teima é o presente. Quem é considerado favorito sempre é acusado de receber privilégios. Crianças, aprendemos a sofrer por amor.
A Nike é a maior empresa de material esportivo do mundo no futebol. Tem muitos filhos: funcionários, jogadores, clubes, federações e personalidades. Em faturamento, superou pela primeira vez a concorrente adidas em 2009/10, tomando uma liderança de cinco décadas da rival alemã.
A Nike chegou ao Bahia causando rebuliço na torcida. De volta à Série A, na luta por vaga na Sul-Americana e desejado pela maior do mundo. Os tricolores queriam adoção imediata pela gigante. Autoestima lá em cima, sonhavam vestir um material igual ao do Barcelona, de Messi, ou do Manchester United, de Rooney. Ou da nossa Seleção Brasileira.
Em menos de um ano, o sentimento é ser tratado como mais um. Saiu a euforia e entrou o questionamento. Em parte, porque as ações não acompanham a expectativa absurda que se criou. A camisa branca só emplacou na apresentação, usando um patuá, amuleto ligado ao candomblé, e símbolos baianos: fitinhas do Senhor do Bonfim, figas e medalhas. Unir fé, religião e futebol, explorando o sincretismo religioso, foi a única ação especial no Bahia. Foi parecido nos adotados Inter e Coritiba.
A camisa tricolor demorou oito meses para chegar, porém é igual à do Caen, da França, exceção à gola. A vermelha, sem o escudo e o símbolo da Nike, é vendida na Netshoes por menos da metade do preço. O material de treino lembra o do Arsenal.
Financeiramente, nos bastidores, garante-se que o Bahia ganha mais dinheiro com a troca da Lotto pela Nike. É ótimo para o caixa. Mas, em atenção, em variedade de produtos e camisas, em ações promocionais, não tem comparação: a Lotto tratava o Bahia como um filho favorito.
Dentro do mercado, o Bahia representa pouco para a Nike. O patrocínio, inclusive, não está ligado à força da marca Bahia, mas a uma estratégia de minimizar o impacto da adidas durante este ciclo de Copa. A adidas é parceira da Fifa e do COI desde os anos 1960. Tem, assim, a garantia de expor a marca e ativar o patrocínio dentro dos eventos e em ações e locais exclusivos.
A Nike precisava, ao menos nas cidades-sede, garantir sua fatia de mercado - e de publicidade. Bahia, Inter e Coritiba entraram nesta cota. É diferente do Corinthians, parceiro nacional, e do Santos, de Neymar. A Nike vai fazer ações no futuro. Fornecer material esportivo foi o caminho para ter a propriedade, afinal ela ainda é uma empresa ligada ao esporte. Mas a Nike não quer os clubes, e sim o burburinho das Copas de 2013 e 2014. O Bahia escolheu o dinheiro. Difícil agora cobrar da Nike atenção e carinho. Não tem nenhuma criança - ou amor - nessa história."
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